Internacional
Conheça a modelo que aos 30 anos acreditou na sua carreira e resolveu ressignificar sua vida através do mundo miss

“Aos 30, me redescobri mulher, negra, forte e modelo”
Entrevista com Leidiane Montes, Miss Universe Bahia 2025
Por Flavio de Holanda
Sentada diante de mim, com um sorriso sereno e olhar firme, Leidiane Montes exala uma mistura de força e delicadeza. Aos 32 anos, a baiana nascida em Salvador e criada em Madre de Deus carrega no olhar a sabedoria de quem precisou se reinventar para se reconhecer. A mais nova Miss Universe Bahia nos recebeu para uma conversa íntima, onde abriu o coração sobre sua trajetória de cura, identidade e beleza.
"Minha essência sempre respirou arte."
“Desde criança, eu já dava meus sinais”, começa ela, com uma risada doce. “Brincava com as roupas da minha mãe, montava salões de beleza imaginários com meus pais como clientes. Era pura criação.” A arte esteve presente em cada fase da sua infância: na dança, nos cursos de modelo, nas atividades culturais da cidade. Mas, por trás desse encantamento, havia também uma busca silenciosa por pertencimento.
“Cresci sem referências. Sem me ver em lugar nenhum.”
Leidiane fala sobre a verdade crua de quem viveu, na pele, o apagamento: “Eu era uma menina negra retinta, de cabelos crespos, criada em uma família majoritariamente branca." A atitude de algumas pessoas naquele meio me gerou feridas que ainda me causam dores na vida adulta. Não havia espelhos onde eu pudesse me ver bonita, poderosa, possível.
O tempo foi levando aquela menina artista a se esconder. “Desconectei-me da arte... e de mim mesma. Tornei-me uma adulta ferida emocionalmente, sem identidade. Não sabia quem eu era.” A educação foi o porto seguro. Professora, coordenadora pedagógica, ela construiu uma carreira sólida — mas a chama da menina criativa ainda ardia, silenciosa.
“Aos 30, comecei a me curar.”
Foi com o apoio do terapeuta, Yossef Leandro, que ela iniciou um processo de resgate. “Foi um reencontro com a moda. Uma lembrança da menina que sonhava, que criava. Mas foi difícil. Eu pensava: 'ser modelo aos 30? Não é tarde demais?'” Ela sorri. “Mas aí me lembrei da minha criança. Ela nunca teve medo.”
Em um gesto de coragem, postou seu primeiro vídeo no Instagram. A resposta veio rápido: um convite para um provador na loja da tia. “Ela se tornou minha primeira patrocinadora, acreditou antes mesmo que eu acreditasse por completo.” Daquele momento em diante, tudo mudou.
De vídeos caseiros a passarelas internacionais.
Vieram as aulas de passarela, fotogenia, os ensaios, os trabalhos como modelo comercial. E então, o grande momento: Miss Universe Bahia 2025. “Ser uma das únicas duas mulheres pretas retintas na edição... e a única com cabelo crespo natural... foi um marco. Não só pra mim, mas pra todas as meninas que ainda não se sentem vistas.”
O confinamento de sete dias em São Paulo foi um mergulho em experiências intensas. De volta à Bahia, um novo chamado: representar o país em Dubai, Paris ou Grécia. “Escolhi Dubai. Levo comigo a força de um povo, das instituições que me apoiam, de mulheres que como eu estão se reencontrando.”
“A moda me curou. E hoje, eu quero ser cura para outras.”
Leidiane não se enxerga apenas como modelo. Ela é símbolo de resistência, de renascimento, de representatividade. Em junho, pisará nas passarelas internacionais como representante do Brasil no Miss Grand Sea World, com o apoio da VFB Assessoria pelo Diretor Flavio de Holanda. Mas ela sabe que sua missão vai muito além da faixa e da coroa.
“Quero que outras meninas negras retintas vejam em mim o que eu não vi quando era criança. Quero que saibam que beleza não tem idade, que identidade é liberdade e que nunca, nunca é tarde demais para se reencontrar.”
E, com um sorriso sereno, ela encerra:
“Aos 30, comecei a viver de verdade. E é só o começo.”
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